mais Pramoedya



Acabei de ler, há uns dias, o primeiro romance do quarteto "The Buru Quartet" do grande romancista indonésio Pramoedya Ananta Toer. Chama-se This Earth of Mankind e Pramoedya contou-o, oralmente, aos seus colegas prisioneiros na ilha de Buru, no arquipélago das Molucas, na Indonésia - porque lhe era negado o uso de papel e caneta na prisão. Durante o regime de Suharto na Indonésia, Pramoedya foi prisioneiro político durante 14 anos nesta ilha pelo seu suposto "comunismo".

Esta tetralogia narra a história de uma revolução: a revolução pela liberdade do ser humano (mais concretamente, a revolução contra qualquer tipo de colonialismo).

Como me aconteceu com os anteriores livros que li de Pramoedya, devorei. É um verdadeiro contador de histórias e imagino como será delicioso lê-lo no original indonésio... Há de udo: há uma infância que não é vivida - orfandade espiritual e maturidade precoce, à Dickens (a criança independente) e à Camilo Castelo Branco (a criança hipersensível votada à tragédia); há inquietude existencialista, à Dostoievsky; há amor proibido por espartilhos sociais, à Jane Austen; há traição, mudança de carácter, loucura e bordéis, um pouco à Hitchcock (a desconfiança e a inquietação) um pouco à Fritz Lang (a psicanálise); há denúncia social, à Brecht (muito fria e directa, sem o humor de um Eça de Queirós); há solidariedade comovente, à Capra; há descrição de costumes e tradições, à Alexandra David-Néel; há erotismo discreto (como quando calam os "fuck" e os "fucking" e os "mother fucker" nos filmes americanos que passam nos canais indonésios, pois há censura), onde a omissão torna a cena profunda e espantosa - inquietante, à Selma Lagerloff e também à Kafka; há espontaneidade, variedade na narração, objectividade, diarística, à voz-off de filme noir; há a suprema força feminina (a mulher inteligente, lutadora e instintiva), à Agustina Bessa-Luís.

Estou muito feliz por ter descoberto este meu novo Autor de cabeceira.