não sabias que agora está na moda parecer totó?

O estilo é um fenómeno que me intriga. Segundo os cânones atuais, eu não tenho nem nunca tive estilo. E bem sei que as pessoas acham que me visto mal. Eu costumava associar estilo a uma forma própria de estar na vida. Recorrendo ao dicionário velhote que me tem acompanhado no meu êxodo, estilo é uma “maneira especial de cada um se exprimir, falando ou escrevendo” (Francisco Torrinha). Hoje em dia, parece-me que o estilo se confunde com a moda e, paradoxalmente, tende a ganhar um sentido oposto, para “maneira comum de todos se exprimirem”. Há quem diga que mesmo assim o estilo não deixa de ser especial, visto que há uma certa extravagância, mais ou menos discreta (sim, porque há extravagância discreta, que é aquela que sobressai não do todo, mas dos pormenores), que lhe é intrínseca. Mas a verdade é que ter uma maneira especial de expressão não envolve necessariamente extravagância, envolve apenas autonomia e individualidade – o que em certos casos pode ser extravagante, por colidir com a opinião geral ou os critérios das massas. Dizia eu que, segundo os cânones atuais (e muito provavelmente segundo quaisquer cânones, de que lugar ou tempo sejam, até do planeta Marte do século XXX), eu não tenho nem nunca tive estilo. Já me apetece agora vitimizar-me um pouco e recitar em coro e voz chorosa com Álvaro de Campos “Serei sempre a que não nasceu para isso; Serei sempre só a que tinha qualidades; Serei sempre a que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta, E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira, E ouviu a voz de Deus num poço tapado. Crer em mim? Não, nem em nada." Digo-vos que bem me lembro que aos 15 anos, já as minhas colegas se pintavam e iam ao salão de cabeleireiro, “roubava” à minha avó blusas de malha velhas e pretas (que ela tinha aos montes; faziam parte do vestuário quotidiano de viúva) para levar para a escola, e lá ia com andar felino e crente de que tresandava a estilo. E como me recordo do frenesi que senti ao colocar pela primeira vez as calças de ganga gastas e larguíssimas do meu tio Téo, que já não lhe cabiam, e de durante anos as vestir com orgulho de rainha. Mesmo assim, havia rapazes que me achavam gira! O desconcerto do mundo! Ainda agora, o meu par de botas favorito, com que escorrego aí pelos lameiros do mundo, encontrei-o eu num saco enorme que uma amiga da minha mãe lhe pediu para pôr num contentor para recolha de roupa usada.


Com a excitação que muitas meninas devem sentir quando vão às compras, abri vorazmente o saco e encontrei umas belíssimas botas castanhas Timberland, de feitio que já não se encontra, com estrias cheias de história pela sua pele curtida e a sensualidade da meia-idade. Estas sim, são botas que falam, e agora estão a envelhecer comigo.
Bom, mas tudo isto é apenas introdução; o que quero é partilhar convosco o que tenho vindo a encontrar na Indonésia. Aqui, está na moda ter estilo de totó (geek style!). Alunas minhas que nunca tinha visto com óculos, começaram repentinamente a usar óculos – mas não uns óculos quaisquer, não, óculos enormes, com armação bem grossa, daqueles que associamos ao pateta sobredotado da turma. E não fica por aqui. De repente, toda a gente decidiu endireitar os dentes e usar aparelho; e quando os meus alunos se riem de alguma das minhas piadas estúpidas, lá me perco, inebriada, por entre aquele mar de metal colorido que lhes escorre dos sorrisos – sim, porque não usam uns aparelhos quaisquer, usam-nos coloridos: rosa-choque, verde-alface, azul-turquesa! Uma aluna minha chegou a dizer-me que agora apreciam a beleza dos rapazes pelo feitio e cor do aparelho que usam nos dentes! E assim, o estilo desentendido dos totós, distraídos, intelectuais introvertidos - passou a ser moda, fazendo capa de revista e sendo considerado extremamente sedutor. E quem usa óculos com armação grossa da testa aos lábios e aparelho bastante saliente de cor vistosa tem mesmo, mas mesmo, muito estilo! Quem fica a ganhar são os verdadeiros totós, que se veem promovidos a conselheiros de moda.