o que é?


A Vina Novianti.
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A Vina é a minha primeira amiga em Jacarta. Gosto muito dela, ainda que ela tenha muitos macaquinhos na cabeça, muitos fantasmas! Gosto dela porque acredito nela. E nós conversamos muito. Através dela, vou conhecendo melhor a Indonésia. No entanto, é sempre uma visão subjectiva - porque é a visão dela. E creio que ela é por vezes injusta com o seu próprio povo e país.
Mas através da Vina fui abrindo os olhos para uma peculiaridade dos indonésios. No início, eu não sabia nomeá-la, apercebia-me dela, por vezes incomodava-me, mas não sabia o que era. A minha amiga trouxe-me as palavras.
No geral, eu não consigo ver para além da cara destas pessoas. Como explicar? São pouco claros. Falta uma espécie de densidade, tridimensionalidade, de profundidade - que nos faz conhecer as pessoas.
Excluindo a Vina, ainda não consegui "conhecer" ninguém aqui. Ao contrários dos nigerianos - que de tão abertos até se tornavam, por vezes, agressivos, rudes - os indonésios são sempre dóceis e têm sempre um sorriso no rosto. Riem muito, mesmo que nem eu nem eles percebamos do que se estão a rir... É uma espécie de defesa e de máscara. E marca uma distância muito grande entre mim e eles, que me angustia.
Depois de uma conversa um pouco tortuosa com a Vina, passeando-nos pelas largas avenidas de Tugu (ihihih, isto é uma piada que só nós entendemos), comecei a pensar nas consequências de mais de 30 anos de ditadura, com o presidente Suharto. Mas achei que não podia ser só disso. Depois pensei na pobreza. Mas a Nigéria também é muito pobre e os meus alunos interrogavam-me constantemente e enquanto não percebiam algo insistiam até perceber ou quase perceber. E criticavam. Se achavam que eu não estava a explicar bem alguma coisa, diziam, e criticavam. E eu melhorava e explicava melhor. Por isso, achei que não podia ser só disso também. Pensei ainda na religião. 80% ou mais dos indonésios são muçulmanos. [um aparte - nunca vi ninguém que desse tanto a mendigos, por exemplo; às vezes, enquanto espero o comboio, vejo meninas de universidade, tão novinhas, a dar esmola a cada mendigo que passa... - o que é a religião? não é show-off?] Mas não consegui encontrar nesse facto uma justificação satisfatória para a minha grande questão!
Então acho que vem daquilo que eu sempre considerei nos asiáticos, que é a polidez. São inerentemente respeitosos e delicados na relação com o outro, principalmente se esse outro for um forasteiro.
E é paradoxal como essa delicadeza me desconforta, porque não há transparência - é só cerimónia.
E com a Vina percebi que isso cria todo um submundo que vai alimentando as pessoas e compensando a sua contenção - como as telenovelas. Por não falarem aberta e directamente sobre aquilo que pensam, canalizam todas as suas opiniões caladas num subterrâneo de intrigas, historietas, por vezes mesquinhas, e invenções. A clara origem do drama.